Humberto de Campos entrevista Yvonne Pereira

yvone

Por Izabel Vitusso

Depois de assistir à palestra do instrutor Gúbio, no plano espiritual, Humberto de Campos avistou a médium Yvonne Pereira na saída em animada conversa, num dos grupos que se formavam espontaneamente para comentar o tema abordado há pouco. Ele a vê rejuvenescida, um pouco mais alta e esguia, o olhar firme como de costume, a traduzir um ânimo infatigável e decidido.

Antes, porém, que pudesse abordá-la, foi ela quem, apercebendo-se de sua presença, disse com entusiasmo:

— Mas, se não é o Irmão X! Jamais recebi uma página que fosse vinda de sua apreciada pena. Eis, por fim, a chance, encontrando-o aqui pelo Além.

— Fico muito feliz em vê-la – respondeu ele.  – Mas... como devo chamá-la? Ruth-Carolina?, Andrea1 ou... — ao que Yvonne respondeu de maneira afável:

— Ora, por favor!... Chame-me simplesmente Yvonne.

Esse instigante encontro entre os dois expoentes da literatura espírita é narrado no livro Yvonne do Amaral Pereira, o voo de uma alma, de Augusto Marques de Freitas, publicado pela editora Celd em 1999.

O autor narra que, aproveitando aquela incrível oportunidade, ávido por ouvir da própria médium o que teria a falar sobre mediunidade, Humberto de Campos acaba fazendo uma verdadeira entrevista, que resumidamente reproduzimos.

Você foi médium. Diga-me aqui, como é que, lá no fundo, se sente o medianeiro, no exercício dessa poderosa faculdade?

A questão da mediunidade é muito séria e complexa, sem dizer que, não raro, os homens a tornam complicada. Se as pessoas se dispusessem a falar menos sobre aquilo que desconhecem, ouvindo, interpretando e aprendendo — em silêncio e com dedicação —, creio que veríamos menos desastres mediúnicos.

Explique sua observação, por favor.

— Do médium, meu amigo, se exige tudo, e nele tudo se critica, com extrema e irresponsável facilidade. Aliás, isso ocorre com toda e qualquer criatura que ganhe evidência.

Se, por exemplo, psicografa mensagens mais longas, já a voz dos fanfarrões anuncia tratar-se de pessoa prolixa, desprovida de poder de síntese. Se as páginas são curtas, isso é porque, além de lhe falecerem as informações básicas, seu poder psíquico não se acha suficientemente desenvolvido.

Poucos se recordam de sua eventual condição física e psicológica menos hígida, em natural oscilação das próprias aptidões, por problemas triviais na índole humana. Todos podem se justificar com o rótulo ‘personalidade oscilante’... Menos os médiuns.

Enfim, meu amigo, vi-me de certo ângulo (e, antes por deficiências de minha própria alma, não por méritos, que não possuo), na posição semelhante à do apóstolo a que se referiu São Paulo: feito espetáculo para os anjos e para os homens.

Em meu caso, concluo ter sido essa a forma de dar testemunho da Verdade, suportando a voragem das mais disparatadas opiniões. Tudo isso me despertou a fé, terreno em que tantas vezes fracassei.
Qual seria o principal conselho aos médiuns?

Que aceitem suas lutas sem estranhá-las, porque são elas que, com base em seus deveres, lhes sancionam alguns direitos, ao mesmo tempo em que lhes promovem o crescimento. Correspondem ao exercício que fortalece a alma. É claro que isso pede boa dose de renúncia... 
Sobre a espontaneidade mediúnica, Humberto pergunta: Que pensa você das escolas de médiuns?

 Assunto muito sério, meu irmão, envolvendo o equilíbrio e o bem-estar psíquico de um notório contingente de almas. Não comporta imediatismo, nem palavras finais.

Sem querer arrombar a porta das construções intelectuais de tantos confrades portadores de indiscutível idealismo, o máximo que consigo admitir como útil é sua feição teórica, na medida em que se proponham a uma reciclagem, mas sem nenhum tipo de obrigatoriedade.

Quanto à parte prática, pelo que tenho observado, não lhes rende a menor valia, podendo erguer-se como estorvo às realizações que o Alto lhe pede. Isso porque os instrumentos dessa categoria contam com mentores espirituais dedicados a instruí-los e ampará-los, principalmente em aspectos práticos que não se acham nem em livros, nem em apostilas.

O fundamental é o suporte da caridade, o esteio da renúncia a si mesmo, que precisam o verdadeiro grau de evangelização do ser humano, determinando-lhe, num quadro muito amplo, a sintonia mediúnica.
Sobre o animismo:

Nenhuma escola de médiuns, ou seja lá o que for, sabe tratar do problema do animismo, tão arraigado se encontra em nosso psiquismo... Ele é produto de nossa realidade de Espíritos, de individualidades eternas.  Tanto que Alexandre Aksakof, o notável metapsiquista russo, sitou-o como uma espécie de degrau conducente ao fenômeno mediúnico.
Não haverá nenhuma regra, uma conduta, que obedeça aos nossos justos anseios de validade universal?

Regras definitivas de mediunidade, não o creio... Faculdade mediúnica é feito impressão digital... Cada uma é uma, e nenhuma se repete. Não obstante, não confunda isso com deseducação mediúnica, indisciplina, falta de noção de conjunto, de equipe.

Maravilhado com tamanha honestidade da médium, Humberto de Campos se despede, “a contemplar o vulto da operosa batalhadora, que o amor de Maria resgatara para o redil do Filho Amado.”


1  Nomes de Yvonne Pereira em vidas passadas, retratadas nos livros O cavaleiro de Lumiers e O drama de Bretanha, FEB