O suicida obsessor da novela “A viagem”

Um suicida pode se tornar um obsessor, como tem mostrado a novela A viagem, com o espírito Alexandre (Guilherme Fontes) continuando a atormentar pessoas depois de desencarnado? Aprendi que, no suicídio, enquanto a carga de fluido vital não terminar no corpo físico, o espírito irá sofrer muito, não conseguindo dele se libertar, ficando preso nessa condição pelo tanto de tempo que abreviou de vida. – Ticiana Nunes, Salvador, BA


Por Eliana Haddad


De acordo com a doutrina espírita, um espírito que desencarna pelo suicídio pode, sim, tornar-se um obsessor. Vai depender de seu nível de perturbação, sua intenção, seus sentimentos e escolhas. Cada caso é um caso com relação ao despertar, ao arrependimento e à reparação do erro cometido contra a lei divina, que ensina que não temos o direito de abreviar a vida.

Como o suicídio não resolve os problemas, pois a vida continua, o espírito geralmente desperta em grande sofrimento, com lembranças vivas do ato e, muitas vezes, com as impressões do corpo físico.

Os suicidas podem não se arrepender, mantendo sentimentos de ódio, revolta ou apego à vida material. Como estão desequilibrados, acabam tendo afinidade com pessoas ou ambientes que vibrem em sintonia com seus pensamentos. Sentindo-se, por exemplo, magoados ou injustiçados, em desespero, aproximam-se dos encarnados e tentam influenciá-los, pois os consideram responsáveis por seu sofrimento, merecendo ser por eles também prejudicados. Aí acontece a obsessão persistente, cuja causa não é o suicídio em si, mas o desajuste moral e o desejo de domínio ou vingança do espírito.

Isso explica por que um suicida arrependido e socorrido não se torna obsessor. O fato é que, de forma alguma, nenhum suicida estará sem amparo espiritual, mas ele precisa aceitar esse auxílio para iniciar seu caminho de libertação, com a ajuda da prece sincera e da predisposição ao esforço pela mudança.

Segundo o espiritismo, o suicídio não condena ninguém eternamente, muito menos a um tempo determinado de sofrimento, pois isso vai depender do arrependimento, do socorro e da regeneração de cada espírito, que terá seu livre-arbítrio respeitado, uma vez que será responsável por seus atos e – mais ainda – por suas verdadeiras intenções.

Allan Kardec abordou a situação de espíritos suicidas em várias passagens de suas obras. São relatos importantes que mostram as dificuldades de cada um e os processos de regeneração para a retomada do caminho – uns, de modo mais rápido; outros, nem tanto. O tempo varia conforme a causa, a consciência e o mérito de cada um, e o sofrimento pode ser atenuado através das preces, vibrações de amor e assistência espiritual.

Valem muito a leitura e o estudo da obra O céu e o inferno, uma fonte importante que traz as sensações da vida após a morte, as inúmeras experiências de espíritos em suas diversas condições evolutivas. São perguntas e respostas, entrevistas realizadas por Kardec com diferentes espíritos na Sociedade Espírita de Paris, no século 19.

Consequências do suicídio

Quais são, em geral, as consequências do suicídio sobre o estado do espírito?

Muito diversas são as consequências do suicídio. Não há penas determinadas e, em todos os casos, correspondem sempre às causas que o produziram. Há, porém, uma consequência a que o suicida não pode escapar; é o desapontamento. Mas a sorte não é a mesma para todos; depende das circunstâncias. Alguns expiam a falta imediatamente, outros em nova existência, que será pior do que aquela cujo curso interromperam.

A observação, realmente, mostra que os efeitos do suicídio não são idênticos. Alguns há, porém, comuns a todos os casos de morte violenta e que são a consequência da interrupção brusca da vida. Há, primeiro, a persistência mais prolongada e tenaz do laço que une o espírito ao corpo, por estar quase sempre esse laço na plenitude da sua força no momento em que é partido, ao passo que, no caso de morte natural, ele se enfraquece gradualmente e muitas vezes se desfaz antes que a vida se haja extinguido completamente. – (O livro dos espíritos, pergunta 957)