A fitoterapia aliada ao tratamento espiritual
Por Izabel Vitusso e Eliana Haddad
Reconhecida pela Organização Mundial de Saúde, a Medicina Complementar e Alternativa (MCA) está presente no Brasil no cuidado de milhões de pacientes, que recorrem a técnicas e terapias naturais para o alívio e cura de suas doenças, buscando o equilíbrio físico e emocional. Algumas delas, entendidas como novas nos países ocidentais, são tradicionais e recorrentes em outras sociedades e culturas, como a acupuntura, o do-in e a fitoterapia, que envolve o uso dos princípios ativos das plantas em favor da saúde. Isso sem falar na homeopatia (Hahnemann, 1755) e na manipulação do magnetismo animal (Mesmer, 1744).
Há poucos dias, o ator Reynaldo Gianechinni, que enfrenta um câncer no sistema linfático, afirmou estar se tratando, além da medicina alopática, também com a assistência espiritual, com médium do interior de São Paulo, lembrando que não dispensa ainda as boas vibrações dos fãs e conhecidos na ajuda de sua recuperação.
No Brasil são inúmeras as possibilidades de tratamentos com uso da medicina complementar, com incontáveis casos de sucesso. Muitos deles inclusive oferecendo soluções não encontradas na medicina convencional.
Foi possivelmente antevendo a quantidade de sofrimentos, dores não-curadas, principalmente da alma, que o médico espírita Bezerra de Menezes e o médium Eurípedes Barsanulfo popularizaram no século 19 a assistência no centro espírita aos doentes e necessitados, aliando o uso da homeopatia e da fitoterapia ao tratamento espiritual.
Para o odontólogo Emerson Palhares, que dá continuidade ao trabalho de seu avô de criação, Langerton Neves da Cunha (veja box), e que dirige no momento o Núcleo Espírita Brasileiro Langerton Neves da Cunha, em Uberaba, MG, não há razão de se ter a fitoterapia nas casas espíritas sem a terapia do Evangelho. “Ela é um complemento da lei do amor e da caridade”. Prova disso é a Caravana do Arco Íris, iniciada pelo avô, da qual ele participa com um grupo de fitoterapeutas, e que viaja todo mês de julho pelo Nordeste, levando o alívio e equilíbrio ao corpo físico e espiritual em locais de maior necessidade. Além de participar deste projeto, cada membro da Caravana realiza semanalmente em seu setor o trabalho vinculado a uma casa espírita, nas mais diversas cidades e estados do Brasil.
“Praticamente não houve interrupção do trabalho com a fitoterapia iniciado por Eurípedes Barsanulfo, em Sacramento, MG, que é hoje o coordenador geral desse trabalho no plano espiritual”– explica Rener Leite da Cunha, e à frente do trabalho de assistência nesse segmento há mais de vinte anos, no Centro Espírita Estrada da Luz e em pelo menos três outras casas espíritas em Uberlândia, MG e região, onde chega a atender com a equipe cerca de 1.500 pessoas por mês.
Desde o século 19, Eurípedes fazia o que chamavam de trabalho de receituário, e distribuía gratuitamente as formulações que ele mesmo preparava na Farmácia Homeopática, tendo a sua mediunidade como um dos instrumentos principais no atendimento de pessoas que vinham de longe para se tratar.1 Através de seu tio Sinhô Mariano, na Fazenda em Santa Maria é que Eurípedes Barsanulfo tornou-se espírita. E logo após a sua desencarnação, foi Sinhô Mariano quem continuou o trabalho no atendimento, ainda por muitos anos. Eurípedes desencarnara muito cedo, em 1918, com apenas 38 anos, vítima da gripe espanhola. A partir de 1959, o médium Langerton prossegue com o trabalho da fitoterapia, em Peirópolis, Uberaba, cujos conhecimentos que detinha sobre as plantas, preparo, acondicionamento, embalagem, indicação, foram aos poucos sendo transmitidos a outras pessoas interessadas, o que propiciou a multiplicação de trabalhadores que formam hoje cerca de 70 grupos semelhantes espalhados pelo Brasil e em cinco países: Alemanha, Holanda, Portugal, Maputo (na África) e Cuba.
“Temos aí o ide e pregai, ensinai, curai os enfermos, expulsai os demônios. Isso é fitoterapia com Jesus” – explica Rener. “Além da parte física, dos recursos das plantas, a fitoterapia obedece à fluidificação da espiritualidade. “Eu posso manipular uma planta, mas na casa espírita o efeito magnético é outro. Os efeitos químicos, biológicos são diferentes”, diz ao recordar o preparo de trinta quilos de cremes e unguentos no dia anterior a essa entrevista. “Tudo é à base de oração, fluidificação; fazemos tinturas com a planta verde [sabendo-se a hora exata de se coletá-la], extraímos o princípio ativo, magnetizamos a tintura através da fluidificação magnética do médium e da espiritualidade”– comenta. “Quando as energias perispiríticas, que são as energias fluídicas do indivíduo, estão em desequilíbrio, lesionam as células e essas células adoecem o corpo físico”– explica Rener, que ao trabalhar no receituário é auxiliado pelos espíritos pela mediunidade auditiva. “Os assistidos vão sendo tratados desde a entrada no Centro, através da equipe espiritual, da palestra que ouvem sobre o Evangelho, até a saída, com seus frascos de medicamentos à base de plantas, distribuídos gratuitamente”– conclui.
Desde a desencarnação de Langerton, em 2003, os antigos aprendizes se reúnem em torno de um ideal e estão conseguindo levantar, no terreno de 10 mil m2 adquirido em Uberaba, o Núcleo Espírita Brasileiro Langerton Neves da Cunha, iniciando-se pelo centro espírita, seguido do laboratório e farmácia, de acordo com as regulamentações das leis civis do Brasil. Terá como objetivo a unificação do trabalho nos atendimentos nos centros espíritas vinculados ao projeto, incluindo o cultivo das plantas, principalmente da região do Cerrado, atendendo às orientações do médium Langerton e da legislação.
Avaliando o trabalho que realiza junto à equipe no Departamento Espírita Casa de Cárita, em Uberaba, Emerson lembra que muitas pessoas procuram o centro espírita em busca de uma cura, “porque todos queremos ficar livres dos problemas, mas não queremos nos modificar. Aí entra o Evangelho, como a verdadeira cura do espírito. A doença é efeito apenas”. A planta tem um princípio ativo que atua no corpo físico e, dependendo da forma de manipulação, também em corpos energéticos mais sutis. Mas a fitoterapia na casa espírita é um instrumento fantástico para atrair o coração humano. “Nosso trabalho principal não é a fitoterapia, mas o Evangelho de Jesus.”
A importância da Universidade nas pesquisas
O médico-cirurgião e fitoterapeuta Dr. Sérgio Mitsunori Soma, formado em medicina na Faculdade de Medicina do Triângulo Mineiro, em Uberaba, na década de 80, também iniciou o trabalho de manipulação das plantas com Langerton e participa a mais de vinte anos no núcleo de Araxá, MG, no Centro Espírita Labor, Fé e Amor, que tem à frente pessoas como o casal Maria de Lourdes, Ismael Honorato e seu filho André Luiz. Sérgio possui uma visão muito clara sobre a relação entre o espiritismo e a medicina complementar. “A doutrina espírita vê o homem como um ser integral e hoje percebemos que a medicina comum está mais preocupada com o tratamento da doença e não do doente; daí a procura dos espiritualistas pela medicina complementar, que atenta de uma maneira mais global às necessidades do que o homem está buscando hoje”– elucida.
Segundo o cirurgião, cerca de 30% das doenças hoje são causadas pelos efeitos colaterais dos remédios alopáticos. Porém deixa claro que reconhece a importância da alopatia. “Mas é preciso lembrar que planta também tem contraindicaçoes”, alerta o médico sobre o perigo da automedicação, em qualquer tratamento. E diz ainda: “O trabalho de fitoterapia aliado ao tratamento espiritual na casa espírita é coisa muito séria. Há uma orientação espiritual muito grande e muitos médiuns que não são médicos conhecem a planta às vezes muito melhor, porque acabam se dedicando ao estudo e à pesquisa para melhor auxiliar”.
Ele destaca o trabalho científico que está sendo realizado em Araxá, citando também o projeto Ecocerrado Brasil.2 Nos últimos onze anos, foi montado um estudo avançado sobre plantas medicinais: catalogando-as com nome científico, popular, origem, reprodução, indicações, contraindicações e referências bibliográficas, o que só aumenta o respaldo científico da fitoterapia no Brasil. “Começamos o estudo com 20 participantes e hoje somos mais de 250 e com aproximadamente 45 representantes de universidades brasileiras”.
“Estamos caminhando para uma medicina mais integral no mundo inteiro. Há outras escolas, não falando propriamente de Kardec, que consideram algo a mais além do corpo físico”. E, como médico e espírita, não tenho dúvida sobre a importância da universidade nas pesquisas sobre o assunto. “Um exemplo disso é a pesquisa da engenheira química Ana Maria Pereira da Universidade de Ribeirão Preto, que participa há muitos anos como voluntária do projeto e vem sendo reconhecida internacionalmente pelo estudo sobre a extração de princípio ativo de uma planta antitumoral”. (acesse www.reservaecocerradobrasil.org/reportagem_no_globo_rural_1.html)
Langerton Neves da Cunha3 sempre esteve às voltas com as plantas e a mediunidade. Nascido na cidade de Jubaí, no Triângulo Mineiro, em 1929, foi por lá mesmo que se criou casou, teve dois filhos e adotou mais onze para completar a família.
Suas primeiras manifestações mediúnicas ocorreram aos sete anos. Aos dezoito era médium curador e, a partir de 1959, sob a orientação de Eurípedes Barsanulfo, tomou-se médium receitista fitoterapeuta. Com atendimento na casa espírita, sempre vinculado ao Evangelho, Langerton fornecia os medicamentos manipulados com plantas medicinais cultivadas na horta que ele mesmo formara e manipuladas na Farmácia Frederico Peiró, na Vila Cantinho Espírita, em Peirópolis, Uberaba, onde residiu e trabalhou.
Com um conhecimento acentuado sobre plantas, princípios ativos e suas aplicações, era frequentemente procurado e se correspondia com inúmeras pessoas do Brasil e do exterior. Também viajava constantemente para levar atendimento aos necessitados e multiplicar trabalhadores na fitoterapia vinculada ao tratamento do espírito. A Vila Cantinho Espírita ainda tinha em sua estrutura o Internato Espírita Nosso lar, Lar dos Apóstolos, Albergue Dr. Adolfo Bezerra de Menezes, Escola de Fitoterapia e o laboratório. Convidado pelo médium Chico Xavier a dar suporte aos trabalhos que realizava aos sábados no Centro Espírita A Prece, em Uberaba, Langerton ali permaneceu durante trinta anos ininterruptos, dedicando-se ao trabalho.
Publicado no jornal Correio Fraterno, edicão 441 • Setembro - Outubro 2011.
Para saber mais:
1- Eurípedes Barsanulfo, o apóstolo da caridade, de Jorge Rizzini (Ed. Correio Fraterno) e O homem e a missão, de Corina Novelino (Ed. IDE).
2-www.reservaecocerradobrasil.org
3- www.casadaluz.com.br
Publicado no jornal Correio Fraterno - edição 441