O exemplo que vem de Anita Briza
Por Rita Cirne*
Que Anita Briza foi uma mulher à frente de seu tempo não é difícil de se constatar. Nem é difícil entender de onde veio a força para tarefas tão variadas e que tanto contribuíram para a divulgação da doutrina espírita no Brasil nas décadas de 1940 e 1950, uma época de tanto preconceito com o espiritismo. A sua crença nos postulados da doutrina é citada por quem a conheceu como um dos pontos altos de sua personalidade.
Ela foi atuante no Movimento de Unificação Espírita no Estado de São Paulo, participou da criação de programas espíritas de rádio, fundou um sanatório para tuberculosos em Campos de Jordão e assumiu um lar para crianças em Osasco, além de fundar a Sociedade de Estudos Espíritas 3 de Outubro, um centro espírita tradicional, iniciado no centro da cidade, mas hoje localizado no bairro da Lapa, em São Paulo. Dava palestras, participava de congressos e atuava nas sessões de tratamentos na casa espírita.
A sua participação na criação da USE – União das Sociedades Espíritas de São Paulo –está registrada no livro Use 70 anos - passado presente e futuro em nossas mãos, de Rubens Toledo, que relata que em 1946, por iniciativa da Federação Espírita do Estado de São Paulo, foi criado o Grupo dos Seis, com a atuação marcante do Comandante Edgard Armond, pela FEESP e de Anita Briza, pela Liga Espírita do Estado de São Paulo, além de representantes da União Espírita Paulista, considerados como órgãos que contavam com a adesão de diversos centros espíritas. O livro também relata através do depoimento de sua filha, Neyde Schneider, que também o escritor José Herculano Pires colaborou com o grupo, diante dos desafios próprios do momento, como por exemplo de saber quantas instituições espíritas existiam no Brasil. São Paulo possuía 733 instituições registradas, mas a maioria não era vinculada a nenhuma entidade federativa. Esse Grupo dos Seis elaborou um manifesto aos espíritas e organizou o Primeiro Congresso Espírita Estadual, de onde nasceu, em junho de 1947, a USE, na época denominada União Social Espírita.
Um olhar para os necessitados
Anita esteve à frente de outros projetos, como a criação, na década de 1940, do programa Espírita entre dois mundos, na Rádio Difusora, mais tarde transferido para a Rádio América. Nos anos 1950 iniciou a construção de um sanatório em Campos de Jordão para atender aos doentes necessitados e integrou a direção da Liga Espírita do Estado de São Paulo. Foi nesta época que acabou fundando a Sociedade de Estudos Espíritas 3 de Outubro. A data de fundação e o nome do grupo foram escolhidos em homenagem a Allan Kardec, o codificador da doutrina espírita, que nasceu naquela data.
Na década de 1970, passou a ser responsável, através do 3 de outubro, pela manutenção do Lar Escola Guri – Grupo Unificado de Reabilitação Infantil, em Osasco. Depois de quatro anos, o Lar Guri acabou se desmembrando da Sociedade e parte das crianças foi transferida para o bairro da Lapa, em São Paulo, dando início ao Lar de Crianças 3 de Outubro, que funcionou até 1990.
Como descrever a Anita? Ela era uma pessoa de fino trato, muito educada, bonita, mas, acima de tudo, determinada. Teve dois filhos: Neyde, que seguiu seus passos na doutrina e Arnaldo que, acometido pela tuberculose, acabou desencarnando.
“A partir do que viu em Campos de Jordão, Anita decidiu fundar um hospital que pudesse dar aos necessitados o mesmo tratamento que seu filho recebera. As dificuldades financeiras foram muitas, o projeto de construção demorou, mas obteve sucesso, através de muitas campanhas realizadas. Inaugurado o hospital, ele funcionou por dez anos. Depois de vendido, o local acabou se tornando um hotel”, explica Sandra Tereza Dugaich Gallucci, atual presidente da Sociedade de Estudos Espíritas 3 de Outubro.
Uma defensora dos estudos da doutrina
Sandra destaca como ponto forte da personalidade de Anita a sua extrema convicção nos postulados espíritas. Para ela, era essencial o estudo da doutrina, o que se comprova no próprio nome escolhido para o centro que ela fundou. E acrescenta que a seriedade da proposta foi entendida pela espiritualidade, que compareceu à inauguração do 3 de outubro em 1950, através da presença de Cairbar Schutel e de Eurípedes Barsanulfo, observadas e comentadas na época por Anita Briza.
Sua filha Neyde, hoje com 93 anos, afirma que uma das lembranças mais fortes do trabalho de sua mãe na divulgação da doutrina foi o exemplo que ela deu ao longo de toda a sua vida. “Ela viveu intensamente o que acreditava e transmitia o seu conhecimento da vida espiritual para quem convivia com ela. As pessoas ficavam tocadas por tudo o que ela transmitia. Para mim, que convivi como filha única, já que meu irmão partiu cedo para o mundo espiritual, pude aprender muito com ela”, afirma.
*Jornalista, colaboradora do Grupo Espírita Batuíra, em São Paulo, e do jornal Valor Econômico.