Apparecido Belvedere e o compromisso com a obra de Cairbar Schutel

Por Rita Cirne*

A divulgação da doutrina espírita e, em especial a Casa Editora O Clarim, de Matão, SP, devem muito ao trabalho de Apparecido Onofre Belvedere, desencarnado no último dia 24 de setembro, aos 95 anos. Ele abraçou essa tarefa como se tivesse recebido um convite direto, feito por Cairbar Schutel, fundador da editora em 1905, a quem não conheceu pessoalmente.

Nascido em 1927, em Bariri, SP, Apparecido Belvedere se identificou com Schutel desde que conheceu o espiritismo, na década de 1960, quando um amigo o presenteou com um exemplar do livro Voltei, escrito por Irmão Jacob, pela psicografia de Chico Xavier.

Morando em São Paulo, foi no Centro Espírita Cairbar Schutel, no Itaim Bibi, que iniciou os estudos das obras básicas da doutrina, e onde conheceu o jornal O Clarim e a Revista Internacional de Espiritismo (RIE), periódicos fundados por Schutel até hoje em circulação.

Ainda na década de 1960, Apparecido viajava a trabalho pela região de Matão visitando usinas de açúcar, o que o possibilitou conhecer de perto O Clarim, sintonizando-se de imediato com o trabalho ali desenvolvido, chegando a afirmar que um dia se mudaria para a cidade para dar in loco a sua colaboração, o que realmente aconteceu em 1975.

Sempre apoiado por sua esposa, Laudicéa Lucca Belvedere, Apparecido começou no controle de assinaturas e rapidamente passou a integrar o conselho de redação, assumindo anos depois o cargo de editor-chefe, que ao lado de Carlos Vital Olson, conduziam as publicações da RIE e de O Clarim, além de avaliar os livros para publicação.

Em busca de recursos

Em entrevista ao jornalista Cássio Carrara1, Apparecido fala sobre os desafios da editora no início da década de 1960, quando foi preciso levantar fundos para a aquisição de novas máquinas gráficas.

Foi então que se realizou em São Paulo uma sessão de autógrafos com Chico Xavier na sede da Casa Transitória, pertencente à Federação Espírita do Estado de São Paulo, para o lançamento de dois livros psicografados pelo médium: Segue-me!... e Escrínio de luz. O evento estendeu-se até a madrugada e num único dia foram vendidos cerca de 5 mil exemplares. A partir daquele dia, Apparecido passaria a ser a ponte para a realização de eventos na capital paulista que levantassem fundos para a ampliação do parque gráfico.

Consolo para a luta

 Apparecido conta que certo dia estava em uma casa espírita onde havia um médium muito bom e de muitos recursos. “Esse médium não sabia que eu estava presente, mas ao final do encontro, chamou por meu nome.” Havia para Apparecido uma mensagem assinada por Cairbar Schutel, na qual o espírito lhe pedia paciência e perseverança no trabalho, considerando que os pequenos percalços faziam parte da luta e que com fé em Deus seriam todos contornados.  

Lembranças do amigo

O jornalista David Liesenberg, que por muito tempo foi parceiro profissional de Apparecido na editora, lembra de quando O Clarim publicou O livro dos espíritos no idioma sueco. “O livro foi lançado em 2003, durante uma reunião do Conselho Espírita Internacional, organizada em Estocolmo pelo grupo do qual eu fazia parte. Belvedere era tão meticuloso e dedicado às obras produzidas pelo O Clarim que fazia questão de conferir, palavra por palavra, dos textos impressos na gráfica. Pois mesmo sem entender uma palavra em sueco ele realizou essa conferência no livro, que recebeu o nome de Andarnas bok”, explica Liesenberg.

 O jornalista comenta que principalmente congressos e eventos médico- espíritas eram os preferidos de Apparecido. Instituições, USEs, Federações ficavam honradas por receberem uma das editoras espíritas mais antigas do mundo. Nas feiras de livros espíritas, Belvedere fazia questão de levar centenas de obras, dentre elas os clássicos de Cairbar, livros de estudos, e também lançamentos. Nunca poderia faltar uma mesa com banner e centenas de fichas para assinaturas ou renovações de assinaturas dos periódicos. Mesmo quando completou 90 anos, o incansável diretor manteve sua rotina diária na editora, mas diminuiu sua participação nos eventos, conta o amigo jornalista.

Dentre tantos fatos que unem a história da Casa Editora O Clarim e o nome de Apparecido, está a grande transição da editora, quando Antoninha Perche, responsável pela instituição desde a desencarnação de Cairbar Schutel, desligou-se da presidência, em meados dos anos 1960. A editora estava em situação precária. Recomendados por Chico Xavier, os espíritas Wallace Leal Rodrigues e Joaquim Alves foram convocados para irem para Matão trabalhar na editora. Foi quando ocorreu uma grande transformação no O Clarim, com a produção de novas obras, incluindo títulos cedidos pelo próprio médium Chico Xavier.

*Jornalista, colaboradora do Grupo Espírita Batuíra e do jornal Valor Econômico.

 

Fontes:

1- RIE, edição de setembro de 2017.

2- Blog do Ismael, julho de 2018.