Lembranças do coma

Por Hamilton C. Rodrigues

O companheiro do centro espírita mostrava-se muito agitado, ansioso e apreensivo diante da cirurgia que iria realizar dentro de poucos dias, contrastando com seu comportamento habitual de calma e tranquilidade. Conhecia-o há anos pelo trabalho assistencial da sopa fraterna, que realizava juntamente com a esposa.

Poucos dias antes do diagnóstico de hérnia de hiato e esofagite, havia-me procurado para uma consulta médica. Teria mesmo que operar, um procedimento de rotina, dentro dos conceitos da medicina atual, uma cirurgia relativamente simples, laparoscópica, com alta prevista para no máximo 48 horas. 

Uma parada cardíaca e insuficiência respiratória aguda pós-cirurgia, porém, levaram-no do centro cirúrgico para a UTI. Ali ficou três dias, em coma, respirando por aparelhos.

Três dias depois, sentado na cama, muito pálido, ainda com máscara de oxigênio, despertou, reconheceu-me e perguntou se já havia sido operado. Recuperado, com bons prognósticos, sem sequelas cerebrais ou cardíacas, queria um remédio para ajudá-lo a dormir, sem se dar conta de que já estivera dormindo há 72 horas.

No dia seguinte, já no quarto, aparência melhorada, havia ainda muita ansiedade e confusão mental. Receitei-lhe um medicamento homeopático. Melhora rápida, três dias depois, já estava de volta ao centro espírita para assistir à palestra e receber um passe. Mas o interessante mesmo foi o que relatou. Ficara em coma, aparentemente inconsciente, mas sua mente, ou espírito, trabalhara intensamente. 

Lembrou-se de fatos antigos de sua vida, de detalhes que realmente o impressionaram – da colcha cor-de-rosa que sua mãe estendia sobre a cama, dos gibis do Tio Patinhas que lia quando criança. Viu antigos parentes e um amigo que já havia desencarnado. Ao perguntar-lhe o que fazia naquele lugar, o amigo respondeu “só vim te ver”. 

Curioso também é que percebeu, provavelmente na terça-feira à noite, no horário do trabalho espiritual do centro; os colegas espíritas visitando-o na UTI, cada um trazendo-lhe uma flor branca. Contou até mesmo que sentia a emoção das pessoas. Das coisas ruins, ficara a sensação de algo girando ao seu redor, uma mão sobre seu rosto e a figura ameaçadora de uma espécie de Homem-Aranha, grudando-se no teto, quando uma amiga pediu-lhe que mentalizasse uma luz azul. Foi quando apareceu a figura de Jesus. “De seu peito saía uma facho de luz azul que me envolvia”, destacou.

Apesar de ser um relato sucinto, esse é um recado para aqueles que só acreditam na matéria e também um alerta para parentes e amigos quantos ao cuidados com os doentes em coma, pois seus espíritos muitas vezes se encontram em estado de extrema sensibilidade e sintonia psíquica. Esses fatos acontecem todos os dias e são relatados em livros, bastando observá-los e estudá-los. Diante de tanta riqueza de informações, como é possível ser indiferente à vida espiritual?

Publicado no jornal Correio Fraterno, Edição 436 nov/dez 2011