A biografia que virou filme
Por Eliana Haddad
Em 2009, a jornalista e historiadora Ana Landi fundava em São Paulo a editora Bella Letra para publicar livros de não ficção, principalmente os que contassem histórias de vida e que transitassem pela religiosidade. Depois de alguns sucessos editoriais, Ana decidiu, em 2013, escrever sobre a vida do médium Divaldo Pereira Franco. O livro agora ganha novo destaque, ao inspirar o longa-metragem que está em cartaz nos cinemas Divaldo, o mensageiro da paz. Em entrevista ao Jornal Correio Fraterno, Ana Landi revela os bastidores desse trabalho e conta suas descobertas e surpresas sobre o homem Divaldo Pereira Franco, sua mediunidade e sua obra de caridade, a Mansão do Caminho, que atende a milhares de pessoas diariamente, em Salvador, Bahia.
Como e por que surgiu a ideia de biografar Divaldo Franco?
Como espíritas, não acreditamos em acasos. Acho que eu tinha que chegar a este trabalho. Vejo como algo que eu sempre soube que tinha de desenvolver. Em 2012, eu havia acabado de editar um livro que fez muito sucesso, a biografia de Eliana Zagui. Ela chegou ao Hospital das Clínicas de São Paulo aos dois anos de idade com poliomielite, paralisada do pescoço aos pés e quase incapaz de respirar. Mais de 40 anos depois, ela ainda vive na UTI do Instituto de Ortopedia e Traumatologia do HC, onde aprendeu a ler e escrever, concluiu o ensino médio, estudou idiomas. Quer cursar a faculdade de psicologia. Com a boca, escreve, pinta, usa celular e notebook. O livro Pulmão de aço relata sua trajetória dentro de um quarto de hospital. Eu a descobri por acaso e viramos muito amigas. O livro impactou a sua vida, pessoas apareceram. Ela se tornou conhecida. E eu me sentia com uma dívida de gratidão. Pelo que ela também fez por mim: uma pessoa melhor, mais corajosa e com coragem para seguir com a editora. Fiquei com essa sensação de que eu deveria descobrir uma história que fosse tão impactante quanto a dela. Um assunto que eu pudesse escrever e que servisse para algo positivo. Um dia, pensando nisso, o nome dele veio à minha mente. Eu pesquisei rapidamente e vi que, apesar de conhecê-lo superficialmente, eu não tinha ideia do que ele havia feito e construído. E, naquele ano, ele faria 85 anos, a Mansão do Caminho, sua obra social em Salvador, BA, também comemorava uma data redonda... Eu pensei: é ele!
Como o livro virou filme?
Havia um projeto para que um filme sobre Divaldo fosse realizado há anos. Quando o livro surgiu, a ideia ganhou força. Ao mesmo tempo, os primeiros idealizadores, os produtores da Estação Luz, fecharam com a Fox Film e a Produtora Cine. Passamos, assim, a fechar os detalhes de minha colaboração.
Você gostou dos recortes que foram feitos na história?
Sim. Gostei do tratamento dado por Clovis Mello . Ele foi muito feliz. Eu tinha muito medo de cometer algum erro doutrinário e, talvez por isso, o filme até esteja sendo considerado bastante voltado aos espíritas. Mas foi uma decisão dele. De passar a mensagem.
Em sua opinião, qual a principal mensagem que a vida de Divaldo passa para espíritas e não espíritas?
Perseverança. Não desistir fácil. Acreditar e insistir. Ele é muito otimista. Tem muita fé.
O que mais a surpreendeu na série de entrevistas que realizou com o médium para realizar esse projeto?
Sou suspeita... Vejo tantas coisas lindas e nobres nele. Mas acho que o que mais me surpreendeu foi descobrir o ‘homem’ Divaldo. Eu tinha aquela visão do palestrante, do ególatra. Da pessoa que busca termos científicos, etc. Mas ele é, na convivência íntima, a pessoa mais engraçada, doce e afetuosa que eu conheço. E uma das mais inteligentes também. Eu o imaginava muito diferente antes de conhecê-lo bem.
Fica evidente no filme a perseguição de obsessores. Qual era o sentimento de Divaldo ao contar-lhe essas histórias?
Ele é muito bem-humorado. Mas dá para notar que passou por coisas terríveis. Ele nunca se fez de vítima. Sempre contou de forma muito leve. Mas sabemos pelo que passou e ainda passa. Há uma força muito grande interessada em desmoralizar todos os que trabalham pelo bem e desestabilizar as casas espíritas ou que trabalham por algum ideal. Segundo ele, os ataques agora são ainda mais pesados. E muitas vezes se utilizando dos mais próximos.
Como analisa a reação do público em relação a Divaldo Pereira Franco?
Vivemos tempos conturbados. As pessoas andam extremistas. Desaprenderam a relativizar. Ou as pessoas são maravilhosas ou devem ser achincalhadas. Realmente eu não sei como o público avalia. Sei o que meus amigos pensam. Mas também nunca me preocupei com isso. Eu queria fazer um livro sobre o homem e a obra. Que não fosse elogioso. Eu não sabia mesmo o que esperar. Sabia que teria muitas resistências no movimento espírita, onde existem muitos grupos que são ‘donos’ e amigos de certos expoentes. Mas tudo isso foi muito tranquilo.
O que diferencia a biografia que você realizou sobre Divaldo das demais, já que você optou por um perfil jornalístico?
Acho que, pela minha formação, foi natural. E foi legal de fazer. Tinha muito, muito material. Eu adorava as entrevistas.
Quando apresentei a Divaldo a proposta de fazer um livro sobre sua vida, ele não concordou em gravar os depoimentos. Perguntei então se podia fazer entrevistas com ele. Fiquei anos só fazendo isso. Porque não queria que acabasse nunca. Uma hora tive de parar e escrever. E fiz em três meses.
Como historiadora, como vê o papel de Divaldo no espiritismo?
Fundamental como divulgador, fundador de núcleos e também exemplo de uma existência que tenta, dentro de todas as possibilidades e desafios, ser fiel ao que acredita. Desde muito novo.
E sobre o episódio referente aos conflitos editoriais envolvendo livros/mensagens de Divaldo e Chico Xavier? Como você sentiu Divaldo em relação a isso?
Ele ficou extremamente magoado. Mas nunca reclamou em público.
Afinal, quem é Divaldo Pereira Franco?
Para mim, um amigo. Um amigo especial. De séculos. Não o idolatro. Só o amo. E até esqueço que ele é ‘famoso’....
Como foi viver Joanna de Ângelis
O Convite
Fui convidada, ou melhor, convocada, para fazer o personagem da Joanna de Ângelis de uma forma muito especial. Eu já conhecia o Clovis Mello [roteirista e diretor]. Minha formação era católica e sempre acontecia de alguém espírita ter algum bom ‘recado’ pra me dar. Um dia ele me disse: “eu tenho um outro desses recados para você: Divaldo Franco te escolheu para fazer o personagem de Joanna de Ângelis, a mentora espiritual dele, no filme que iremos gravar sobre sua história”. Surpresa, agradeci, dizendo que aceitava e que ele podia contar comigo.
Clovis havia levado para o Divaldo fotos de várias atrizes e mais algumas minhas. No entanto, Divaldo falou, apontando para uma das minhas fotos: “É ela quem vai fazer o personagem Joanna de Ângelis”. Quando o encontrei, ele me olhou e deu o maior sorriso do mundo. A gente se abraçou e falei da minha gratidão, pela oportunidade e honra de ter sido escolhida. E ele respondeu: “Eu e Joanna que escolhemos, não é minha filha? E você sabe disso”. Apenas sorri, porque nem soube o que dizer...
A emoção de ser Joanna
No primeiro dia das filmagens, quando coloquei o hábito, fiquei muito emocionada! Eu me senti muito abençoada! Ali, naquele exato instante, eu vivi um momento de compreensão e clareza sobre o porquê da minha própria vida aqui na Terra, de ser atriz, Senti uma profunda gratidão de estar naquele lugar.
Em seguida, quando entrei no set para gravar a primeira cena, percebi imediatamente um silêncio diferente, que se fez espontaneamente naquele local, seguido da expressão que eu ia vendo aparecer no rosto de cada pessoa que estava ali. Assim que me viam como Joanna, ficavam realmente muito emocionadas. Achei muito lindo! Gostaria de ter tido uma câmera na mão para filmar aquele momento. O próprio Clovis ficou muito tocado. Foi muito especial aquele dia!
O caminho da paz e do amor
Não me esqueço das coisas que foram acontecendo na minha vida pessoal. O quanto eu estava passando por um momento difícil, e a forma como este convite chegou. Depois, à medida que eu ia lendo um capítulo de cada livro de Joanna, lembro o quanto fui sendo nutrida. Sinto que esse caminho eu não posso perder nunca mais. O caminho da paz, de a gente estar bem consigo mesmo e de sempre buscar fazer o bem para o outro. Temos que internalizar isso.
Desejo que as pessoas compreendam o recado maior do filme, que é saber que tudo depende do amor: que a gente tem que acreditar nele, e que qualquer ato de amor vale, pois é o amor o que nos move!
Fonte: Bastidores do filme Divaldo, o mensageiro da paz, Intelítera.