Cairbar Schutel: uma visão à frente de seu tempo para divulgar o espiritismo
Por Rita Cirne*
Conhecido como Pai da Pobreza de Matão e O Bandeirante do Espiritismo, Cairbar de Souza Schutel iluminou os caminhos não só dos que o procuravam em busca de receitas e medicamentos gratuitos no pequeno município de Matão, em São Paulo. Sua contribuição foi também vital para a divulgação da doutrina espírita e dá frutos até hoje, através do jornal O Clarim, que fundou em 1905, e da Revista Internacional de Espiritismo – RIE, que este ano completa 100 anos de circulação.
Os que o conheceram testemunharam sua gentileza, humildade, sentimento de amor ao próximo e um grande amor pela ciência. Todo esse potencial pôde ser desenvolvido apesar das dificuldades que enfrentou. Nascido no Rio de Janeiro, em 22 de setembro de 1868, ficou órfão de pai aos nove anos e, seis meses depois, também de mãe. Foi criado pelo avô paterno, mas aos 17 anos Schutel já era um bom prático de farmácia, quando se mudou para o estado de São Paulo. Fixou-se, primeiramente, na cidade de Piracicaba, onde dirigiu a Farmácia Neves, e, posteriormente, em Araraquara e Matão.
Matão era uma vila na época e tinha características próximas à ruralidade. Schutel trabalhou para que o local se emancipasse de Araraquara e contribuiu de forma decisiva para que subisse à categoria de município, tendo sido ele o primeiro presidente da Câmara Municipal, em 1889.
Mas sua vocação não era a política. Conheceu o espiritismo através de seu amigo Manuel Pereira do Prado, passando a partir daí a estudar as obras fundamentais da doutrina. Não demorou muito para Schutel perceber suas faculdades mediúnicas, sobressaindo-se a psicografia, por meio da qual recebeu belíssima mensagem de seu pai, provando a sobrevivência da alma.
A farmácia de Schutel tornou-se ponto de encontro para discussões filosóficas e espirituais, incentivando-o a fundar, em 1905, o Centro Espírita Amantes da Pobreza, a primeira casa espírita de toda a região.
O bom combate
Numa época em que os seguidores da doutrina espírita eram perseguidos, Schutel não se intimidava. Ia às praças defender-se das acusações e realizar conferências. Dessa forma, pôde se dedicar à doutrina e continuar com o seu trabalho de atendimento a quem precisasse. Sua residência chegou a ser transformada em hospital de emergência para doentes mentais e obsediados e frequentemente ia até os pacientes, atravessando grandes distâncias pelas zonas rurais.
Divulgando o espiritismo
Além da dedicação aos mais pobres e doentes, Schutel se tornou uma das grandes vozes da doutrina espírita. O jornal O Clarim, que começou a circular dias depois de fundado o centro espírita, passou a disseminar o espiritismo para um público muito maior. Em matéria de assuntos, ele tinha predileção pelo Dia de Finados. Todos os anos, produzia edições especiais do jornal, trazendo temática direcionada à imortalidade da alma. Nesse período, a tiragem da publicação chegava a quase 50 mil exemplares. As pilhas de jornais alcançavam o teto da pequena sala da tipografia. Aqueles que iam ao cemitério chorar ou homenagear seus mortos recebiam um exemplar de O Clarim. Independentemente de a pessoa ler ou não o jornal, o desafio da mudança de paradigma estava lançado.
Mas o seu ideal como divulgador iria além. Por manter correspondência com os estudiosos do exterior, Schutel sonhava com a edição de uma revista que abordasse temas da ciência espírita como os publicados nos periódicos europeus e americanos.
Há 100 anos iniciou a revista RIE. Suas primeiras edições transcreviam artigos traduzidos de reconhecidos periódicos internacionais, como Light, La Revue Spirite, Vie d’Outre Tombe, Hoy, City News, Luce e Ombra, Luz del Porvenir, La Tribune de Genéve, Ghost Stories e Psychic Science, assinados por grandes escritores e pesquisadores da época, como Camille Flammarion, Ernesto Bozzano e Arthur Conan Doyle, entre outros.
O incansável divulgador do espiritismo criou também o primeiro programa de rádio espírita, na Rádio Cultura de Araraquara, em 1936. Como jornalista, manteve uma seção de crônicas e reportagens no Correio Paulistano e na Plateia. Também escreveu livros, dentre eles: Espiritismo e protestantismo, Histeria e fenômenos psíquicos, O diabo e a Igreja, Médiuns e mediunidade, Gênese da alma, Materialismo e espiritismo, Fatos espíritas e as forças X, Parábolas e ensinos de Jesus e O espírito do cristianismo.
“Sou imortal”
Cairbar Schutel desencarnou em 30 de janeiro de 1938. Através do médium Urbano de Assis Xavier, na mesma noite comunicou-se, sugerindo como frase para a lápide em seu túmulo: “Vivi, vivo e viverei, porque sou imortal”.
Na espiritualidade, continua o seu intenso trabalho de auxílio, enviando mensagens de consolo e incentivando o trabalho, da mesma forma quando encarnado, dizendo: “Vamos aproveitar bem o tempo! É preciso que se faça algo pelo espiritismo e pelo próximo! O amor e a caridade não têm relógio!”
Bibliografia
Grandes espíritas do Brasil, Zeus Wantuil, FEB.
Grandes vultos do espiritismo, Paulo Alves Godoy, FEESP.
Cairbar Schutel na intimidade, Sergio Lourenço, CEAC.
O imortal Cairbar Schutel, David Liesenberg, IDE.
*Jornalista, colaboradora do Grupo Espírita Batuíra, em São Paulo, e do jornal Valor Econômico.