O segredo das curas

Por Roque Jacintho

O doutor Fortes era um médico generoso. Interessava-se pelos doentes, fosse qual fosse a sua condição social. Porém, a técnica precária da medicina na época, quase sempre o colocava em desvantagem diante das enfermidades.

Clinicando, também, na enfermaria do Convento de Santo Antônio, passou a observar o enfermeiro Fabiano de Cristo, que vencia onde ele se sentia derrotado.

Daquelas mãos dedicadas vira doentes sem esperanças saírem recuperados e retornarem à vida comum, sem sinais das doenças que deveriam tê-los vitimado.

Deveria haver ali algum segredo – conjecturava muitas vezes. E certo de que esse segredo existia, passou a inspecionar cada um dos atos de Fabiano.

Talvez tudo estivesse na água!

Sim! É que a cada doente em estado grave, Fabiano ministrava uma porção de água. E até para aqueles portadores de feridas graves, ele aplicava gotas d’água na região enferma, obtendo cicatrizações espantosas.

Fortes queria dominar aquele conhecimento.

– Há dias te observo trabalhando na enfermaria, irmão Fabiano!­ – diz o médico, após Fabiano de Cristo haver distribuído porções d’água a diversos internados. – Por mais que queiras negar, colocas nessa água algum recurso medicamentoso que desconheço.

– Nada faço que qualquer um outro não possa fazer, doutor! – disse o interpelado.

– Desculpe-me, porém não creio! Afinal, eu te trouxe doentes irrecuperáveis e, três dias após, ei-los refeitos e a te ajudar! E vi que nada lhes deste além de água.

O médico insistia:

– Se guardas avaramente teu segredo, lembra-te de teu dever de humanidade! Muitas outras pessoas poderiam retornar à normalidade, se me revelasse o teu conhecimento.

– Mas, doutor, eu só apiedo-me diante de cada um que sofre. Eles chegam aqui e nada sei de enfermagem! Como socorrê-los? Apanho, então, as canecas com água e faço as minhas orações, para cada doente em particular.

E, diante do médico admirado, complementou:

– Sabendo que a vida vem de Deus, rogo ao Pai de misericórdia que abençoe a água que Ele próprio criou e que nela dê o seu sopro de vida, como dá à vida inicial ao homem.

Houve uma pausa longa, quebrada pelo reticente médico:

– E...?!

– E sabendo que o Pai atende a todas as súplicas desinteressadamente, sei que a água se transforma num santo remédio. O que Deus coloca nela, nunca perguntei! Só sei que, com muito amor e muita fé, vou ministrá-la aos doentes, em nome de Jesus Cristo!

E continuou:

– Se o senhor fizer isso, doutor, Deus por certo te atenderá, pois Ele me ouve a mim, que sou ignorante e pecador, e mais te ouvirá pelas tuas virtudes.

Sabe-se que algumas vezes, o doutor Fortes foi visto dando pequenas porções d’água a escravos enfermos!

 

Baseado no livro Fabiano de Cristo, o peregrino da caridade, de Roque Jacintho, Ed.Luz no Lar.