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Os benefícios do esquecimento do passado

Por Andréa Laporte*

Muitas pessoas questionam não somente quando e como ocorre o esquecimento das lembranças das nossas existências anteriores, mas também a justiça desse esquecimento e o real objetivo da reencarnação sem o conhecimento evidente desse passado.

Como a doutrina espírita explica que somos seres imortais, criados simples e ignorantes, e passamos por diversas experiências nem sempre agradáveis, podemos começar a esclarecer a questão já partindo da informação trazida em O livro dos espíritos, item 257, sobre o perispírito: “liame que une o Espírito à matéria do corpo, princípio da vida orgânica, mas não o da vida intelectual”. 

Aprende-se também no espiritismo que “o perispírito é apenas um agente de transmissão, pois é o Espírito que possui a consciência...”, o que nos permite perceber que nossas memórias ficam gravadas, portanto, no Espírito, ainda que nunca se veja separado do seu envoltório fluídico.

Como a sabedoria e a misericórdia divinas são incontestáveis, Deus em sua perfeição considerou mais adequado que ao reencarnar o Espírito tivesse o esquecimento do passado, pois nos seria extremamente constrangedor ter todas as lembranças de nossas experiências passadas na vida corpórea. Afinal, não podemos esquecer que em nosso atual grau evolutivo ainda oscilamos entre as boas e as más ações nos nossos caminhos de tantos aprendizados. 

Saber quem fomos, o que fizemos, a quem prejudicamos e por quem fomos prejudicados certamente nos causaria desequilíbrios. Longe, porém, de acharmos que fomos “jogados” na roda da vida, pois o esquecimento, plenamente ao nosso favor, é apenas temporário.

Na erraticidade, de acordo com seu estágio evolutivo, o Espírito é capaz de verificar sua trajetória, avaliar suas faltas e conquistas, para poder repensar novas oportunidades que possam melhor solidificar seu aprendizado, preparando-o para novas tentativas antes do retorno à vida material. 

Na reencarnação, o processo de ligação entre o Espírito e a matéria propriamente dita se inicia no momento da concepção com a ligação fluídica entre seu perispírito e o novo corpo, sendo ele submetido a certa perturbação. 

Quando nasce, o ser reencarnante vai recobrando as suas faculdades, retomando a consciência, mas com o esquecimento do que se passou. Durante a vida material, enquanto o corpo descansa, dorme, a alma se desprende. Ao despertar, podem inclusive ocorrer algumas recordações dessas vivências e certas lembranças surgirem em forma de intuições, pois “as nossas tendências instintivas são uma reminiscência do nosso passado” (LE-393). A cada nova experiencia corpórea, o ser também está mais e melhor desenvolvido em seu aspecto intelectual, o que vai também lhe permitindo maior compreensão do bem e do mal, para melhor resistir às tendências de suas imperfeições, passando a compreender e a analisar mais adequadamente a sua situação atual, como um verdadeiro estímulo para o despertar e aprimoramento de suas virtudes.

Se o Espírito se lembrasse de todas os acontecimentos de sua trajetória, certamente suas escolhas pretéritas influenciariam diretamente em suas atitudes no presente, retirando-lhe o mérito de suas conquistas, pois as vívidas lembranças de seus atos e, principalmente, de pessoas de sua relação envolvidas em situações conflituosas seriam obstáculos a serem superados. E é assim que cada nova existência é sempre um novo recomeçar, com aptidões e capacidades em nós permanecendo de maneira latente.

Vale lembrar que algumas pessoas podem ter fortes lembranças de vidas anteriores, o que serve para convencimento e reflexão a respeito da pluralidade das existências. Há também quem tenha apenas ilusões a respeito. Todos nós, entretanto, somos intuídos pelas lembranças das nossas consciências e, para saber o que fomos, sugere-se analisar as nossas boas e más tendências na vida atual.

Pela perfeição de suas leis, Deus nos concede de forma justa e benevolente o que nos é necessário e suficiente para o nosso aprimoramento, cabendo a nós aproveitar da melhor maneira as infinitas oportunidades de recomeço, fortalecidos na determinação de vencermos a nós mesmos e, também, de aproveitarmos o próprio desafio da nova experiência para a reparação de questões anteriores, através do reencontro com aqueles que prejudicamos ou que nos prejudicaram em existências precedentes. 

O segredo da certeza do dever cumprido está justamente em aproveitar da melhor forma essa encarnação, utilizando-se as conquistas intelectuais para análise de nossos pensamentos, sentimentos e ações, que visem ao autoconhecimento para que se promova um esforço contínuo para domar paixões e tendências inferiores, nos adequando à prática e vivência cristã. 

*Assessora do Departamento de Doutrina da USE Estadual e secretária  da USE Regional de Campinas, SP.