A filosofia espírita no processo de autoconhecimento
Por Maria José Marcos*
Desde o início da pandemia, todos estão sendo convidados à reflexão, e escuta-se muito o termo ‘o novo normal’. Neste processo, surpreendem-se pensando sobre quem são, de onde vêm, para onde vão, questões que nos acompanham desde sempre.
O processo de autoconhecimento demanda disciplina, estudo, reflexão, e a filosofia espírita propicia isso. Mas, é importante que se diga: nesta caminhada é necessário munir-se de coragem.
Um bom exemplo a ser lembrado é Santo Agostinho, que ao decidir pelo processo de autoconhecimento, partiu para dentro de si, se deparando com todas as suas torpezas e mazelas, conforme manifesta em sua obra Confissões.
Nessa mesma medida, a grande maioria das pessoas, espíritos milenares, fazendo uso do livre-arbítrio, escolhem uma caminhada calcada em desejos incontidos; desrespeito de toda ordem às leis divinas, afastam-se da origem, que é o Pai.
Allan Kardec perguntou (questão 115), em O livro dos espíritos, se os espíritos teriam sido criados alguns bons e outros maus. E obteve como resposta que Deus criou a todos simples e ignorantes, tendo-os como finalidade chegar progressivamente à perfeição, pelo conhecimento da verdade. “Os espíritos adquirem esses conhecimentos ao passarem pelas provas que Deus lhes impõe. Alguns aceitam essas provas com submissão e chegam mais prontamente ao seu destino. Outros não conseguem superá-las sem queixas e destarte permanecem, por sua própria iniciativa, distanciados da perfeição e da felicidade prometida.”
A resposta dos espíritos à questão 630 de O livro dos espíritos orienta em como distinguir o bem do mal, ao afirmar que “o bem é tudo o que está conforme à lei de Deus, e o mal tudo que dela se afasta. Assim, fazer o bem é conformar-se com a lei de Deus; fazer o mal é infringir essa lei.” Desse modo, o mal é a privação ou ausência do bem.
A perfeição, que enseja a beleza manifestada por meio da inteligência elevada e vasto acervo de valores morais, é conquistada, paulatinamente, a partir das escolhas corretas.
O processo de autoconhecimento, no modelo socrático de “Conhece-te a ti mesmo”, assim como na filosofia espírita, passa pela identificação dos defeitos, erros e limitações aos quais o espírito precisa renunciar para continuar seu processo de ascensão e libertar-se das amarras que o impedem de aprender a amar-se para que possa amar ao próximo como a si mesmo. Afinal, é assim que desenvolve a empatia, a capacidade de identificar no outro algo de si.
A doutrina espírita, sob a batuta de Jesus, fornece esse itinerário, na medida em que delineia os passos para se atingir o autoconhecimento.
O evangelho segundo o espiritismo oferece roteiro seguro, podendo-se citar a título de exemplo, seu capítulo 11, “Amar ao próximo como a si mesmo”, o principal mandamento e o maior desafio para os espíritos que fazem parte da comunidade terrestre na atualidade.
Mas, como é possível amar o outro se não se ama nem a si? O autoamor é a primeira coisa que o ser humano precisa alcançar para em seguida amar ao seu semelhante. Esse autoamor será conquistado à medida que o ser humano conseguir libertar-se de doenças da alma: orgulho, vaidade, inveja, ciúmes, etc, curando-se para que consigam manifestar sua essência divina e terem condições de amar a si e aos outros.
No capítulo 25 do Evangelho, “Buscai e achareis”, ao tratar do tema “Ajuda-te a ti mesmo, que o céu te ajudará”, há uma relação direta com a Lei do Trabalho e Lei do Progresso, explicando-se que o autoconhecimento se processa por meio de um trabalho árduo, diuturno, que não se esgota numa única encarnação. O crescimento é lento, mas constante e ilimitado.
Apesar das nossas limitações, é preciso lembrar sempre que não estamos sozinhos nessa abençoada casa planetária. No capítulo 6 do Evangelho, com seu amor infinito, Jesus reiteradamente convida: “Vinde a mim, todos vós que estais aflitos e sobrecarregados, que eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei comigo que sou brando e humilde de coração e achareis repouso para vossas almas, pois é suave o meu jugo e leve o meu fardo”.
Seu jugo é a observância da lei de Deus; mas, esse jugo é leve e a lei é suave, pois que apenas impõe, como dever, o amor e a caridade.
*Advogada e estudiosa da filosofia espírita.