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A estranha missão de Eliazar

De uma sensibilidade marcante, este texto do espírito Alfredo, recebido pela médium Dolores Bacelar na década de 1950,  fala das nossas dificuldades, como civilização, em nossa trajetória evolutiva. Ele nos acalenta quando descreve toda assistência e o acompanhamento dos espíritos superiores, diante  de decisões sociais impactantes para a história humana. Mesmo quando parece que tudo está perdido, há sempre um chamado para o amor e a paz.

Desde que os homens, impelidos por orgulho e ambição, dispersaram-se pelo orbe, criando os usos e expressões mais estranhos, dificultando, assim, a confraternização além das fronteiras onde estavam situados, Eliazar – o protegido de Deus – fora encarregado de unificar os homens separados pela Babel das línguas. 

Batalha ele, em conjunto com outros espíritos em missões idênticas à sua, pelo armamento ético da humanidade. 

Mas passemos ao nosso relato... 

Lembranças

Recordo aqui aqueles nebulosos dias, quando vimos, com inquietação nos espíritos, que nuvens de discórdia cobriam os horizontes das nações terrestres prenunciando tempestade… 

O fantasma da guerra agigantara-se em meio às trevas da confusão reinante, assombrando-a... 

Do infinito, sentíamos nós, discípulos e mestres, a angústia que perturbava a humanidade encarnada, receosa de nova hecatombe quando mal se solevantava de uma guerra, fruto de sonhos loucos de imperialismo e ambição de certos espíritos que, esquecidos do inigualável sentimento que é o Amor – força geradora de paz e harmonia desde os lares até às pátrias – seguiam um só objetivo: manter equilibrado o fiel da balança de suas vidas, indiferentes a que seus atos modificassem o equilíbrio da paz planetária. 

Ângelo, um dos mentores dos planos evangelizados, que batalhava também na Terra pela implantação da paz neste orbe, com Eliazar, acompanhados por todos nós, seus discípulos, foram convocados para socorrer aqueles irmãos aflitos.

A caminho do socorro

Recebidas as instruções necessárias, seguimos para a cidade europeia onde se reuniam em congresso, naquela tarde, os líderes de quase todas as nações do planeta.

Discutiam, em plenário, a razão de ser daquele conclave: a paz mundial. 

Soubemos, assim, que um dos inúmeros territórios africanos, protetorado de um país europeu, fora invadido por uma potência estrangeira, que faltara, deste modo, aos postulados do Direito Internacional, que consideravam invioláveis e sagradas as fronteiras de qualquer Estado. 

Aquele abuso de força e poder revoltara, aparentemente, os países civilizados, líderes dos destinos do globo.

Unindo-se em sociedade, juraram solucionar o caso em questão e ali estavam ouvindo as partes em litígio, para depois, guiados pela justiça e solidariedade humanas, deliberarem o caminho a seguir. 

Enquanto os oradores discursavam em línguas estranhas à maioria dos presentes, as suas palavras iam sendo traduzidas à compreensão de todos; mas em virtude das inúmeras dificuldades a serem vencidas pelos intérpretes, as traduções para tão diversas línguas chegavam deturpadas aos ouvidos, criando assim situações embaraçosas, por vezes cômicas, outras trágicas. 

Interesses escusos e lei de sintonia

Aproximei-me de Eliazar, que projetava sobre a assembleia fluidos magnéticos plenos de vibrações de paz e, respeitosamente, perguntei ao esclarecido espírito:

– Por que as discussões destes homens são tumultuosas, se todos visam ao mesmo fim: a paz?

– Por dois motivos fundamentalmente contrários à boa harmonia entre os homens. Primeiro: muitos destes irmãos estão dominados por um autointeresse. As suas palavras não condizem com os pensamentos íntimos. Por isso, estão imantados às influências espirituais mais negativas. 

– Mas, por que, então, as forças do Bem não lhes interceptam as ações? – inquiri.

– Por que o Bem não vai de encontro a nenhuma lei divina. E isto seria ferir o livre-arbítrio das criaturas, violentá-las em seus sentimentos. 

Ansioso de esclarecimento, continuei inquirindo:

– Falastes de um motivo: do íntimo interesse que os domina. Mas qual o outro motivo essencial que lhes dificulta a fraterna compreensão?

– A falta de uma língua comum a todos os povos. Uma língua internacional.

– Não compreendo…

– Logo compreendereis… Se os homens discutissem os assuntos de interesse geral em linguagem conhecida de todos, chegariam mais facilmente a um acordo, economizando tempo e trabalho.

– Sim, tendes razão. Porém eles não possuem já uma língua internacional – o esperanto?

– Já a possuem – respondeu Eliazar. – Mas não oficialmente aceita pelos povos… Há países até em que o estudo do esperanto é proibido por seus governos.

– Por que, se essa língua conduz à paz?

– Por isso mesmo. É que ainda há almas que somente sabem respirar numa atmosfera de terror e destruição.

Luzes para os representantes das nações

Aproximando-se ainda mais da assembleia, Eliazar pediu que nos concentrássemos em silêncio.

Fitei Eliazar. Ele orava e o seu belo rosto resplandecia de paz interior.

Aos poucos uma luz banhou todo o ambiente, iluminando-o… Hordas de espíritos abnegados circulavam em torno da assembleia, neutralizando as correntes negativas que tentavam envolver as mentes de todos os delegados em conferência.

O próprio orador que discursava naquele momento foi perdendo a exaltação de que estava possuído. Suas palavras desceram a um diapasão mais harmônico e comedido. 

Foi dada a palavra, pela ordem, ao líder do país invasor.

O seu discurso foi um repto à guerra. Defendeu uma tese sobre a necessidade de orientar os povos bárbaros, de guiá-los. 

Falaram mais alguns delegados e, depois, os trabalhos e debates daquela tarde foram encerrados. 

Nós velamos em prece até que a assembleia abriu as suas portas para nova reunião. 

Ia processar-se a votação… 

Ousadamente (a ousadia é própria dos ignorantes), perguntei a Eliazar:

– Não percebo por que os homens não preferem seguir o bem em vez do mal. Por que assim acontece?

– Porque não estão aptos ainda para o bem. Cada humanidade tem o mundo que merece; cada homem a vida correspondente aos seus sentimentos. O meio onde estamos situados reflete a nossa alma. Quando vemos um campo cultivado, sentimos que é habitado por homens operosos; se presa de ervas daninhas, que ali imperam a negligência e a inatividade… O homem laborioso é o Bem; o , o Mal.  O mal não existiria se o homem não o criasse com as suas próprias mãos... Como, também, o bem só existe em função do homem.  O mal desaparecerá, quando cessarem as causas e os efeitos por ele provocados... 

– Quer dizer que o homem terrestre ainda está longe de uma plena felicidade?

– Coletivamente, sim. Depende de todos nós essa feliz plenitude... Depende de nossa capacidade de amar. Quando a humanidade vibrar em uníssono com as leis divinas, justo será, e lógico que o seu mundo se eleve à condição de céu, porque o mundo em que vivemos reflete as nossas ações e sentimentos.

– Mas essa parte da humanidade terrestre que soube, individualmente, elevar-se acima das fraquezas de seus semelhantes, tem que ficar sujeita ao atraso espiritual da maioria que a compõe?

– Não; cada uma dessas partes ascende aos planos a que faz jus. A árvore que vence o emaranhado da floresta e se eleva além dele, vê o céu. Assim o homem. Nada estaciona no universo! Atingido um plano evolutivo, o ser não se paralisa... Inicia nova escalada até chegar à última ascensão: Deus.

– Nesta assembleia – ousei perguntar ainda, – sentimos que muitos destes homens desejam a guerra. Será justo que os poucos que aspiram à paz sofram as consequências de um conflito entre nações?

– Todo sofrimento presente tem suas raízes no pretérito... Ninguém sofre inocente. Certamente as ações de agora destes irmãos e daqueles a quem representam, serão medidas e pesadas e servirão de contrapeso na balança da justiça divina, quando forem avaliados os seus méritos. Mas – exortou-nos Eliazar –, vibremos para que estes homens, nossos irmãos, que estão abusando do livre-arbítrio, não se deixem vencer por suas paixões… 

A escolha pela paz e não pelas paixões

O resultado do pleito era de interesse geral. 

Aproximei-me de delegado em delegado. Sempre a mesma coisa. A maioria votava impelida por suas próprias vantagens; grande parte já trazia o seu voto de antemão determinado pelas imposições políticas de seus governos, e para estes a assembleia fora, mais uma vez, o cenário de uma representação destinada a consolidar posições sempre radicais; a minoria votava sem perceber bem o que fazia... Somente um pequeno número votou conscientemente em prol da paz. 

Logo soubemos o resultado do pleito: as nações, em maioria, votaram pró-neutralidade.

Que a potência europeia defendesse o seu protetorado...

As demais nações não se envolveriam no conflito, nem pró nem contra.

A guerra continuaria esmagando a Terra com seu rude tacão!…

Fitei em Eliazar meu olhar inquiridor… Com doçura nos disse ele:

– O conflito vai ferir apenas uma pequena parte do globo. Mas, creiam: o mundo se aproxima da sonhada paz. Os caminhos que levarão o homem até a ela vêm sendo delineados pelos séculos afora... Citaremos três desses muitos caminhos que, se trilhados, conduzirão à paz, à felicidade, ao céu: Evangelho, espiritismo, esperanto. 

Fitei respeitosamente Eliazar. Quando atingiria o seu objetivo?

Porém que importa uma fração de tempo aos missionários de Deus? Mil anos, na Terra, é um minuto na eternidade...

O sol da paz fulgirá!

Hoje?... Amanhã?...

Que importa o tempo? Aos olhos de Deus não existe tempo nem espaço: tudo é Infinito.

Estranha missão a de Eliazar.

Alfredo (espírito), por Dolores Bacelar*

*Do livro A canção do destino, publicado pela Correio Fraterno em 1982, com contos de espíritos diversos, psicografados por Dolores Bacelar.

A dedicação de Dolores Bacelar
A médium Dolores Bacelar dedicou grande parte da vida em prol da doutrina espírita. Psicografou diversos títulos, auxiliou instituições de caridade.

Médium psicógrafa, seguiu à risca a orientação que recebera de Alfredo, um dos espíritos responsáveis pela orientação da médium: que se mantivesse na discrição. Dolores manteve-se quase no anonimato.

Nascida em 10 de novembro de 1914, era sobrinha de tio com fortes vínculos com a Igreja. Sua mediunidade começou a dar seus primeiros sinais na década de 1940.

Assustar-se e gritar com pedestres nas vias públicas, por achar que estavam prestes a ser atropelados, era fato corriqueiro para a médium. Na verdade, eram os espíritos transitando.

Quando ficou viúva, em 1988, Dolores estava com 74 anos; era já avó de oito netos, mas se sentia em forma para assumir mais trabalho. Há anos realizando atividades com crianças órfãs no Lar Amigo, ela ainda aceitou a presidência da Sociedade Espírita Seara dos Servos de Deus.

Ao conhecer o trabalho do Lar da Criança Emmanuel, em São Bernardo do Campo, Dolores manifestou interesse imediato em ceder àquelas crianças os direitos autorais das obras psicografadas: A mansão Renoir, A canção do destino, Novos cânticos, A rosa imortal e À sombra do olmeiro, e a série Às margens do Eufrates da qual faziam parte O alvorecer da espiritualidade, Guardiães da verdade, Veladores da luz, O voo do pássaro azul (todos reunidos recentemente, em 2018, em um único volume intitulado Mesopotâmia, luz na noite do tempo) e o último, Jonathan, o pastor. Todos assinados por Espíritos com perfil semelhante ao da médium, que preferem se revelar pelas obras, e não pelo nome. Assinam simplesmente como: Um Jardineiro, Josepho ou Alfredo.

(Redação)