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Hahnemann e a medicina dos fluidos

Por Izabel Vitusso

Membro-fundador do Núcleo Universitário de Saúde e Espiritualidade da Universidade Federal de São Paulo- UNIFESP, o médico homeopata e geriatra Rodrigo Modena Bassi já realizou inúmeras palestras pela Associação Médico Espírita (AME) sobre temas envolvendo saúde e espiritualidade.

Nesta entrevista ao Correio Fraterno, ele fala sobre homeopatia e destaca a importância do trabalho de seu fundador, Samuel Hahnemann (1755-1843), que mais tarde também viria a participar da equipe do Espírito de Verdade, que assessorou Allan Kardec para trazer ao mundo o espiritismo, o Consolador Prometido.

 Quem foi Hahnemann e qual a sua relação com Allan Kardec?

Hahnemann nasceu em Meissen, na Alemanha, e se formou em medicina em 1779. Logo se desiludiu com as práticas médicas da época, pensando inclusive em abandonar a medicina. Mas, em 1790, iniciou o desenvolvimento dos seus estudos que viriam a estruturar as bases da homeopatia. Publicou em 1810, o livro base da homeopatia: Organon da medicina racional, depois Organon da arte de curar. Em 1835, mudou-se para Paris, onde faleceu, em 1843, sem ter contato com Allan Kardec. Assim que retorna ao mundo espiritual, se integra à equipe do Espírito de Verdade, atuando ativamente nas orientações doutrinárias, desde os primeiros contatos de Allan Kardec com o mundo invisível e manifesta-se em diversas comunicações sobre medicina, homeopatia, tratamento de processos obsessivos, emoções e processo de cura. Hahnemann foi – e continua sendo – um dos gigantes da revelação espírita, um dos pioneiros da medicina da alma.

Como atua a homeopatia?

A homeopatia é considerada um sistema médico de caráter holístico e sistêmico, baseado no princípio vitalista – força ou energia vital – que comanda e regula as funções e sensações do corpo físico. Quando essa força vital se encontra em desequilíbrio, apresentam-se sintomas físicos, inflamatórios, metabólicos, emocionais e mentais.

O método terapêutico da homeopatia se baseia em quatro pontos: Semelhante cura o semelhante (a substância medicamentosa é capaz de curar os mesmos sintomas que foi capaz de produzir); Experimentação no homem são (método científico de experimentação controlada das substâncias medicamentosas em indivíduos sem sintomas e de observação dos sinais e sintomas que surgem a partir desse uso); Doses mínimas e dinamizadas (diluições dos medicamentos seguidas de sucussões, com o objetivo de desprendimento da energia medicamentosa); Medicamento único (uso de um medicamento por vez, para harmonização do sistema vital, que visa ao tratamento da totalidade dos sintomas do indivíduo). 

Na visão da homeopatia, como acontece o adoecimento?

Ele acontece de forma sistêmica e a homeopatia almeja o tratamento integral do indivíduo que se encontra doente e não apenas da doença ou do sintoma isoladamente, uma vez que as doenças são geradas pelo desequilíbrio de forças vitais do organismo.

Como é realizado o tratamento homeopático?

O tratamento é individualizado e busca restabelecer a saúde do indivíduo estimulando seu potencial curativo. Na anamnese homeopática, além dos aspectos físicos, constituição corporal, sintomas específicos e gerais, a homeopatia visa a compreender, em profundidade, aspectos da personalidade e do caráter; reação às dificuldades da vida; relacionamentos; momento de vida; questões traumáticas que ficaram armazenadas e que estão influenciando o estado de adoecimento atual.

Há interrelações do entendimento do processo saúde–doença na visão da homeopatia e na visão do espiritismo? 

Hahnemann ensina que “no estado de saúde, a força vital que anima dinamicamente o corpo material governa com poder ilimitado e conserva todas as partes do organismo em admirável e harmoniosa operação vital, tanto com respeito às sensações como às funções, de modo que o espírito, dotado de razão que reside em nós, pode empregar livremente este instrumento vivo e sadio para os mais altos fins de nossa existência.” Assim, o estado de saúde é gerado pela interação equilibrada entre Espírito, Força Vital e Corpo Físico. A saúde do corpo físico depende do equilíbrio da força vital, que sofre a influência dos pensamentos, sentimentos e ações do espírito.

O espiritismo ensina na mesma direção quando traz que o processo de adoecimento se inicia na dimensão espiritual (desarmonia com a Lei Divina), levando a um desequilíbrio progressivo dos corpos energéticos (perispírito e corpo vital) e do corpo físico.  

Qual o papel da doença na evolução do espírito? 

O estado de enfermidade é sempre um convite à reflexão íntima. Se bem aproveitado, é excelente oportunidade para que o espírito olhe para si, diante da paisagem árida da enfermidade, e se pergunte: o que está acontecendo comigo? Em qual direção estou indo? O que me adoeceu? O que preciso fazer para restabelecer o equilíbrio perdido? O processo de cura, do ponto de vista espiritual, significa elaborar novas criações mentais, transformar as vibrações dos sentimentos.

Afinal, a homeopatia atua no perispírito?

Emmanuel declara no livro Plantão de respostas (Ed. CEU) que, “obedecendo a lei de sintonia, os medicamentos homeopáticos penetram com facilidade a estrutura mais essencial do indivíduo (...) Atuam energeticamente e não quimicamente, ou seja, sua atuação terapêutica vai se dar no plano dinâmico ou energético do corpo humano, que se localiza no perispírito”.

Entendemos que a medicação homeopática atua no corpo vital ou duplo etérico. Inicialmente, é absorvida através de receptores do corpo físico e, por ressonância vibratória, esparge energeticamente os fluidos que contagiam outras camadas do perispírito, auxiliando no equilíbrio progressivo, restaurando o dinamismo vital e físico.

O que Kardec comenta sobre o tratamento homeopático? 

Entre outros textos presentes na Revista Espírita, Kardec escreve na edição de 1868: “A desordem orgânica será tratada pela introdução de materiais saudáveis para substituir os materiais deteriorados. Esses materiais podem ser fornecidos pelos medicamentos naturais, homeopáticos e pelo fluido magnético. Onde um triunfa o outro pode fracassar. A terapêutica homeopática parece ser a intermediária, o traço de união entre esses dois extremos, e deve particularmente triunfar nas afecções que se poderiam chamar mistas...”

A proposição aqui é claríssima de que a homeopatia atua nas “doenças mistas”, no desequilíbrio no corpo físico e na dimensão energética, apresentando um papel de destaque como auxílio dos processos de cura, isoladamente ou integrado com outros recursos terapêuticos. 

 Como um medicamento material pode curar enfermidades emocionais?

 Allan Kardec, no texto da Revista Espírita de março 1867, esclarece que “os medicamentos homeopáticos, por sua natureza etérea, têm uma ação de alguma sorte molecular; sem contradita, eles podem, mais do que outros, agir sobre as partes elementares e fluídicas dos órgãos, e modificar-lhes a constituição íntima. Entretanto, [...] nenhum medicamento pode solucionar enfermidades como o ciúme, o ódio, o orgulho a cólera etc. Se isso fosse possível, seria a negação de toda responsabilidade moral e o homem mais primitivo poderia tornar-se bom de súbito, sem grandes esforços, e a humanidade poderia ser regenerada com a ajuda de algumas pílulas”. 

Assim, entendemos que a homeopatia não é capaz de curar enfermidades emocionais, porque isso é um trabalho que compete a cada espírito, porém pode auxiliar bastante no processo de autoconhecimento e abrir campo para a transformação moral, através da significativa melhora da vitalidade, rompendo condicionamentos mentais e fisiológicos de longa data e permitindo que o espírito possa vislumbrar novos caminhos, novas escolhas de pensamentos, sentimentos e ações.  

 Já desencarnado, Samuel Hahnemann acrescenta algo a respeito?

Ele se aprofunda nessa temática em mensagem assinada em O evangelho segundo o espiritismo, capítulo 9, quando diz. “Todas as virtudes e todos os vícios são inerentes ao espírito. A não ser assim, onde estariam o mérito e a responsabilidade? [...] O homem não se conserva vicioso senão porque quer permanecer vicioso. De outro modo, não existiria para o homem a lei do progresso”. 

Na Revista Espírita de 1863, Hahnemann afirma que o espiritismo seria um poderoso auxiliar para a homeopatia. Por quê?

Acredito que por compartilharem uma visão do processo saúde-doença com muita proximidade, trazendo aos médicos um caminho terapêutico de atuação no ser espiritual; indo além do aspecto material de tratamento do corpo físico. 

 Como será a medicina do futuro? 

Ela traçará, para cada paciente, um diagnóstico e uma terapêutica que abrangerá o ser espiritual, o corpo energético e o corpo físico; associando medicamentos químicos, fluídicos e espirituais, visando ao pleno equilíbrio. A homeopatia terá papel de destaque junto a outras práticas de saúde integrativas. De forma harmônica, a integração entre ciência e religião em nossa intimidade abre as portas para um novo tempo, para o tempo de regeneração.