A contribuição do Brasil na pedagogia mundial
Até mesmo seu nome é capaz de revelar quantas diferenças existem entre nossa cultura e a do Leste Europeu. Przemystaw Grzybowaki é o pedagogo polonês convidado a participar do Congresso de Pedagogia Espírita, para falar sobre Allan Kardec e também sobre o educador de Janusz Korczak, considerado o Pestalozzi de seu país. Com expansividade, mais para aluno latino do que professor europeu, “Pchemek” – assim é carinhosamente chamado – não se ateve a falar sobre Kardec para a plateia que, segundo ele, mais conhece sobre o espiritismo no mundo. Além de palestra “Pchemek” interagiu em oficinas de arte e esperanto, com os jovens e crianças participantes do evento e nos concedeu rápida entrevista.
Por que e como você se interessou pelo espiritismo?
Com 14 anos, participei de um encontro para adolescentes e, no momento que estava entediante, resolvi fazer uma evocação dos espíritos através dos copos. Um fenômeno espiritual ocorreu que me impressionou fortemente, a ponto de me interessar pelo assunto. Depois eu escrevi para a FEB – (Federação Espírita Brasileira) e Afonso Soares enviou-me os livros: O Livro dos Espíritos e o Livro dos Médiuns, em esperanto.
Pelo que você diz, o esperanto é uma importante porta para o acesso da doutrina espírita no Leste Europeu, no exterior de maneira geral.
Certamente. Eu sou a real prova disso. Se não tivessem obras em esperanto eu não conheceria o espiritismo.
Como é a divulgação do espiritismo na Polônia?
Muito pequena. Somos ao todo nove espíritas na Polônia. Sete são brasileiros. Quando surgiu a literatura espírita na França, a Polônia não existia no mapa. Tivemos grandes problemas em nossa língua. Lá, não apareceram traduções na obra de Kardec. Apenas uma pequena classe de pessoas iam para a França e muitos tentavam traduzir parte da obra, mas não conseguiram.
A primeira tradução de O Livro dos Espíritos para o polonês apareceu em 1886, e foi tão pequena que não encontrei um exemplar sequer dessa edição. A grande influência da igreja teve recursos para não deixar aparecer tais obras. As obras de Kardec que puderam ser traduzidas só surgiram depois da queda do comunismo.
Conhecendo esses fatos, pode-se concluir porque é tão miserável o conhecimento da doutrina espírita lá. Existiram algumas partes do mundo onde surgiu relativo movimento espírita, principalmente sobre o território da antiga Tchecoslováquia. Porém, hoje poucas pessoas existem para contar essa bela época.
Já conhecia obras do Chico Xavier?
Conheço 4 ou 5 obras editadas em esperanto. Paulo e Estevão, Há Dois Mil Anos, Mundo Maior, Nosso Lar. São livros interessantes, mas na Europa, como é uma cultura muito racional, eles vêem como romance de ficção, sem maiores conseqüências.
Você já traduziu alguma obra espírita para o polonês? Escreveu alguma?
Traduzi O Livro dos Espíritos e o Livro dos Médiuns. Também Céu e Inferno, que está na editora, mas estão sem dinheiro para publicar. Escrevi duas obras: uma com artigos que coletei e outra sobre a história do espiritismo, com cerca de 450 páginas.
De que forma nós, brasileiros, podemos ajudar no avanço da divulgação do espiritismo na Polônia, por exemplo?
Acredito que o primeiro passo seja mesmo através da tradução de obras importantes do espiritismo, que na Europa são desconhecidas. Existem centros espíritas em muitos países da Europa: França, Itália. Nós sabemos quando há eventos lá. Mas é grave o problema da diferença de línguas. É comum encontrarmos centros onde freqüentam brasileiros e franceses tentando diálogo e o bom convívio.
Já que a grande maioria dos poloneses tem como religião o catolicismo, como foi para sua família encarar seu interesse pela doutrina espírita?
Na Europa, ninguém entende e espiritismo como religião. Se falarmos que espiritismo é uma religião, logo eles vão entender como sendo uma seita. Na Polônia, não se pode usar a palavra doutrina, porque entendem como algo negativo, como fascista, comunista. Por isso, o espiritismo é apresentado como filosofia, e quem aceita os princípios do espiritismo como filosofia o aceita em seu conjunto, independentemente da visão política e religiosa que possua.
E o que você leva de mais importante desta sua vinda ao Brasil?
Para mim, como pedagogo, vejo a ação social do espiritismo no Brasil como aspecto que mais se destaca. Esses dados, essas informações que levo têm uma preponderância e já despertaram, nos colegas de lá, também o interesse. Talvez, seja por esse caminho que o espiritismo venha a ser respeitado lá fora. Desejo ver um dia, na Polônia, conferência espírita tão bela como vejo aqui.
Janusz Korczak, o pestalozzi polonês
Janusz nasceu em Varsóvia, há pouco mais de cem anos. Vindo da elite cultural polonesa, cresceu na solidão, preservado das influências do exterior, sem se dar conta de que era judeu e sem saber o que isso significava. Porém, jovem ainda, tinha a opinião de que o mundo deveria passar por uma revolução, mas moral.
Formou-se médico e, aos 34 anos de idade, abandonou o exercício da profissão para se dedicar inteiramente às crianças.
Possuía uma compreensão extraordinária do mundo infantil e revelava sua convicção de que a criança deveria lutar pelos seus direitos no mundo governado pelos adultos. Inaugurou em 1912 o orfanato Lar das Crianças, em Varsóvia, acolhendo cerca de 200 judias carentes, em regime totalmente participativo, sendo a instituição administrada por meio de Parlamento e Tribunal, que organizavam a vida em comunidade e solucionavam os conflitos, exercitando as crianças e também os educadores no espírito da participação e responsabilidade. Em 1942, por ação do extermínio nazista, o orfanato deixou de existir. Escritor e radialista, mantinha um programa extremamente popular ouvido pelas crianças, que lhes enviava cartas buscando orientações como: “o que fazer se não tenho dinheiro e vejo alguém passando fome?, minha mãe continuará me amando, com a chegada do meu irmãozinho?”.
Reconhecido por sua dedicação e trabalho pedagógico, Janusz foi considerado o Pestalozzi polonês e declarado o símbolo da moral e da religião do mundo moderno.
Izabel Vitusso
Publicado no jornal Correio Fraterno, edição set./out/ de 2006.