Meu convívio com Leão Pitta
Por Raymundo Espelho
Quando criança, participávamos das aulas de evangelização cristã no Centro Espírita Bezerra de Menezes, em Catanduva, interior de São Paulo. Na época, o livro-base usado pelas casas espíritas quase sempre era um dos clássicos de Eliseu Rigonatti, 52 lições de catecismo espírita. Lembro-me do autor ter nos visitado, ministrando-nos inclusive aulas que nos ajudaram a sedimentar os conhecimentos doutrinários. Era época em que iniciávamos os estudos escolares.
De lá para cá fizemos inúmeras amizades no meio espírita, muitas delas mantidas até hoje. Foi naquela época que tivemos a grata satisfação de conhecer um grande divulgador espírita, amigo inclusive de Cairbar Schutel e de José Herculano Pires. Seu nome: João Leão Pitta.
Fora numa daquelas manhãs de domingo de evangelização cristã. Ele era representante da Casa Editora O Clarim, editora de Matão responsável pelo jornal O Clarim e a Revista Internacional de Espiritismo e percorria grande parte do território brasileiro, o que contribuía para sua felicidade de bom cristão e a de muitos de nós.
Com sua presença marcante e enigmática, Leão Pitta nos contou histórias maravilhosas e bem apropriadas para nossas idades. Em seguida, vinham as recreações, quando a meninada ria muito e se soltava.
O grande momento acontecia quando ele se sentava em uma cadeira e diante dele fazíamos fila, meninos e meninas, para montarmos 'cavalinho' em seus joelhos, quando ele, divertindo-se, simulava uma corrida.
Alisando suas barbas embranquecidas, que chegavam perto da cintura, nos entretínhamos naqueles momentos que brincavam com a nossa imaginação.
Pitta reencarnou para esta existência no dia 14 de abril de 1875 na Ilha da Madeira, em Portugal, e desencarnou no Brasil em 11 de fevereiro de 1957, destacando-se por sua inteligência e dinamismo.
Quando completou 16 anos de idade, seus pais insistiram para que ele se ordenasse padre. Mas em vez disso, preferiu migrar para o Brasil, onde se casou com Maria Joaquina dos Reis e teve 12 filhos. Em virtude de epidemia da época, três filhas do casal desencarnaram. Mais tarde, já adulto e com meus filhos crescidinhos, vim a conhecer uma das filhas do casal. Morava em Itanhaém, litoral de São Paulo, e casada com Kardec Rangel Veloso.
Mas a enfermidade de uma de suas filhas quando ainda pequenas foi o que fez com que Pitta procurasse um centro espírita para tratamento pela mediunidade de cura. Em pouco tempo, a melhora e depois a cura da filha levaram-no a repensar a sua repulsa pelo espiritismo. Ele que sempre relutara em ler livros espíritas, passou a aceitá-los e a lê-los com interesse, captando seus ensinamentos com extrema facilidade.
Tomando conhecimento sobre a doutrina, sem perda de tempo, passou a divulgá-la e em pouco tempo a escrever livros, fazer palestras, frequentar reuniões de estudos e mediúnicas.
A primeira palestra espírita que o Herculano Pires assistira foi através de Leão Pitta, em Marília, no interior paulista. Gostou tanto que se tornou seu grande amigo e admirador. Posteriormente Herculano o denominou de "O Apóstolo do Espiritismo no Brasil".
Requisitado, Leão Pitta realizava palestras, principalmente pelo interior de São Paulo, onde certa feita, em uma de suas explanações em Botucatu, Marino Oliveira Lobo, outro grande divulgador da doutrina, teceu comentário discordando de uma de suas citações. Este, com raciocínio rápido e aproveitando para descontrair a plateia, engatou: "Não te esqueças, meu amigo, se tu és um Lobo e eu ainda sou um Leão".
Além de Cairbar e Herculano Pires, outro nome de referência na história do espiritismo faz parte das experiências em vida de Leão Pitta.
É que logo depois de fundar um centro espírita em Cerqueira César, ele começou a sofrer perseguições, que lhe fecharam todas as oportunidades de emprego. Nesse período crítico, sua esposa costurava para ganhar algum dinheiro. E foi numa loja de ferragens em Piracicaba que ele voltou a tirar o ganha-pão, permanecendo ali trabalhando por 20 anos. Pedro de Camargo, o reconhecido autor espírita de cognome Vinicius, foi quem lhe ofereceu o apoio no momento crítico, e com quem teve depois oportunidade de convívio, trocas e realizações.
Um a um, os trabalhadores foram chegando, escrevendo suas histórias, dando nome a inúmeras casas espíritas e deixando em nós ensinamentos e lembranças. Algumas inesquecíveis.
(Publicado no jornal Correio Fraterno - edição 458 - julho/agosto2014)