Uma visão de Paulo I
O Czar Paulo I, que era então apenas o grão-duque Paulo, estava em Bruxelas, ao lado de amigos. Falavam sobre fenômenos sobrenaturais quando ele contou que uma noite estava hospedado num hotel em São Petersburgo e resolveu passear pelas ruas, em companhia do príncipe Kourakin e dois criados.
Ao dobrar uma esquina, pela abertura de uma porta, percebeu um homem alto, magro, envolto num manto, com chapéu de militar enterrado sobre os olhos. Aos poucos, a enigmática figura colocou-se à esquerda de Paulo, seguindo com eles, sem dizer uma palavra.
Era impossível distinguir seus traços. Mas Paulo notou que o lado esquerdo do seu corpo se esfriava pouco a pouco. Virando-se para Kourakin, disse:
– Eis um singular companheiro que temos!
– Que companheiro? – perguntou, espantado o príncipe.
– Este que marcha à minha esquerda e que faz tanto barulho.
Kourakin olhou atentamente e, não vendo tal companheiro, retrucou:
– Vossa alteza mesma toca a parede, e não há lugar para ninguém entre a parede e vós.
Paulo não sabia dizer como: o homem estava ali, caminhando ao seu lado, com passos batendo ao chão como um martelo.
Foi então que conseguiu examiná-lo atentamente e viu brilhar sob seu chapéu um olhar cintilante que o impressionou.
De repente, uma voz profunda e melancólica saiu do manto que lhe escondia a face que o chamou pelo nome: “Paulo”!
– Paulo, pobre Paulo, pobre príncipe!, repetiu!
– Quem és e o que deseja?, replicou Paulo.
– Sou aquele que se interessa por ti. O que quero? Que não te apegues muito a este mundo, porque aí não ficarás por muito tempo. Vive como justo, se desejas morrer em paz; e não despreze o remorso, é o suplício mais pungente das grandes almas, respondeu-lhe o ser misterioso.
Continuaram a marcha e, ao se aproximarem da Grande Praça, a estranha figura foi até um determinado ponto e parou. Paulo seguiu-o maquinalmente, ouvindo em seguida:
– Paulo, adeus. Tu me verás ainda aqui e em outros lugares.
Depois, como se Paulo o tivesse tocado, seu chapéu ergueu-se sozinho, deixando seu rosto descoberto, fazendo com que a enigmática figura fosse reconhecida. Era o seu avô Pedro, o Grande, que desapareceu, sob o seu olhar de grande espanto.
Naquele exato local, na Grande Praça, seria levantado tempos depois o monumento em homenagem ao Czar Pedro, atendendo a um pedido da imperatriz.
Revista Espírita, abril de 1866.